domingo, 31 de março de 2013

Shogun

No post anterior eu havia mencionado rapidamente o Shogun, o melhor japonês da cidade e, que eu saiba, do país. O Shogun faz parte do mesmo grupo de outros bons restaurantes da cidade, com diversos públicos: a churrascaria Esplanada Grill, o internacional Emporium, que são os melhores; a versão angolana do Bob's, o chinês de shopping TaiPing e o BaySide, que tem uma comida bem variada mas é um dos lugares mais irritantes da cidade - só que disso a gente fala em outros posts. Todos esses lugares têm administração brasileira e o principal sócio é o riquíssimo empresário nipobrasileiro Minoru Dondo.

O Shogun fica na Ilha, e parte dele dá direto para a praia. Vários restaurantes da Ilha são assim: você é atendido nas mesas e desce direto para a areia, numa área estranhamente limitada como sendo do restaurante. Não é: em tese, qualquer pessoa pode ficar lá, mas o cidadão comum, que não está ali para consumir, acaba procurando trechos livres, sem a vigilância dos guardas. Por causa disso, até, esses restaurantes fazem muito sucesso entre estrangeiros e a classe alta angolana.

É comum ver estrangeiros na areia até o limite do restaurante; em seguida, angolanos. É algo que me faria pensar em apartheid, se não houvesse também angolanos do lado de cá da praia, com a diferença que eles têm muito dinheiro. O Shogun não é diferente: até pelos preços bem salgados, o público é o que chamam de "selecionado", e usa-se a palavra sem qualquer pudor.

Ambiente à parte, estamos mesmo em um restaurante muito bom, de ótimo atendimento. São quatro (novamente) ambientes: um restaurante fechado em forma de estufa de vidro, circular; a parte de fora do mesmo restaurante, ao ar livre, sobre um deck de madeira; o teppaniyaki, que é basicamente um balcão em meia lua, sem mesas, onde se come apenas grelhados (cardápio diferente do restaurante), também dentro de uma caixa de vidro; e a própria praia, com espreguiçadeiras, guarda-sóis e algumas mesas. Vamos falar aqui da experiência do restaurante, na primeira caixa de vidro.


  

O qualidade deste menu é ser básico e muito bom. Não tem variedade, não tem sushis malucos, não tem nada esdrúxulo. De entrada, começamos com uma sopa de peixe, boa mas forte demais, e um misoshiro, que não está no cardápio. Se você pedir, eles trazem lá do bar em meia lua. Entradinha campeã: tataki de salmão, muito provavelmente o ponto alto da noite. 


Em seguida, o econômico (nem tanto) combinado para duas pessoas. Basicão e delicioso, sushi e sashimi de salmão e atum, muito bem cortado, o que não é comum aqui. Não raro o sashimi despedaça, tanto por inabilidade do sushiman, quanto por questões de acondicionamento, suponho. Com a energia caindo toda hora e geradores nem sempre confiáveis, acho que o peixe importado congela e descongela, perdendo a consistência e ocasionalmente provocando diarreias. Com certeza esse não é o caso do Shogun.  Estava tudo impecável.


Curioso é que o público angolano, mesmo o com mais grana - que frequenta esse tipo de restaurante -, não tá acostumado com a comida japonesa. Numa mesa ao lado, com quase dez pessoas, só duas comeram, e o fato de saberem usar os hashis causou espécie aos demais. No resto das mesas, a maioria absoluta era de estrangeiros.

Pra finalizar, vamos pecar pelo excesso: tempura de sorvete, ou, como explica o garçom, "gelado frito". É basicamente impossível de encarar sozinho se você comeu sopa, entrada e prato principal. Sem contar que mesmo pra quem comeu pouco deve ser uma sobremesa peso pesado. Começa muito bom, mas fica rapidamente enjoativo. Divida com alguém ou peça outra coisa.


Atenção: novamente chegamos sem reserva, e só conseguimos uma mesa de canto. Em fins de semana a reserva é mesmo fundamental: 931756580.

quinta-feira, 28 de março de 2013

O Caril

Como se pode ver no post de apresentação abaixo, a ideia desse blog é velha, mas a execução nunca realmente arrancou. Até agora. Comecemos pelo O Caril, um dos dois restaurantes indianos com alguma proeminência na cidade, junto com o Broadway - se não me engano, são os dois únicos. Comi n'O Caril pela primeira vez essa noite, após dar com a cara na porta do Shogun, o melhor japonês da cidade. Às oito da noite, todas as mesas vazias, mas todas reservadas. Fomos para O Caril, ali perto.

Explicando a geografia de Luanda para quem não conhece: há um grande número de restaurantes na turística Ilha de Luanda, que na verdade é uma estreita faixa de terra paralela à baixa da cidade. Antes, a ilha era uma ilha de verdade, mas, após o aterro no ponto mais próximo entre os dois lados, virou uma península, e esse intervalo de água com a cidade virou uma baía. Pois bem, tanto o Shogun quanto O Caril ficam na Ilha.

Enquanto a maior parte dos restaurantes desta zona estão total ou parcialmente a céu aberto, em frente à praia, O Caril fica exatamente no meio da faixa de terra, sem dar para o mar aberto nem para a baía. Quem passa vê à direita apenas a placa com o nome do restaurante, mas a entrada fica numa ruazinha lateral, e o restaurante é na verdade o subsolo de um hotel do qual é independente, o Palm Beach.

Traduzindo para brasileiros: caril é curry. O tempero é muito usado aqui, não exatamente por causa dos indianos, e sim, claro, por causa da presença portuguesa e as influências culinárias entre as colônias, no caso, com Goa. No caso desse restaurante, os donos são mesmo indianos, e não há como ter qualquer dúvida assim que a gente entra no recinto, que tem todos os clichês de exagero que a gente associa a esse país.

O LUGAR


O ambiente é dividido em dois níveis, com mesas mais altas nas laterais e um as mais baixas no centro. O teto espelhado, o espaço amplo e os detalhes de decoração dão a impressão de que o restaurante foi instalado numa boate de muito sucesso nos anos 70, um ponto de luxo do período imediatamente pós-colonial. Curiosamente, minha mesa foi a única a estar ocupada durante toda a noite, mas, segundo os funcionários, não se trata de decadência. Às sextas e sábados eles lotam, o que compensa toda uma semana de movimento fraco.


Outro lance notável é que o indiano-maître nos atendeu em inglês imediatamente, algo que também acontece no Broadway. O cara fala português, mas provavelmente o público é em sua maioria estrangeiro não-lusófono. Angolano com certeza esse público não é, afinal eles costumam ser bem conservadores nos hábitos alimentares, raramente fugindo à comida local e à portuguesa. 

A COMIDA

  
Pois bem, eles não sabem o que estão perdendo. Começamos com a prova de fogo de qualquer indiano, a chamuça. Provei a de frango e de vegetais (ervilhas e cebola, basicamente) e estavam muito boas. Havia a opção de chamuça e outros pratos com carne, o que me pareceu estranho, já que nenhum outro indiano que já frequentei serve. Ou talvez essa carne do menu não seja vaca. Não perguntei. Ainda de entrada, uns bolinhos de espinafre realmente estupendos, no formato de cookies, e uma tiras de frango bem apimentadas. Antes dos pratos principais, ainda, muito pão indiano, com sabor a cebola, alho, queijo e hortelã. O de cebola era o melhor, de longe. 


Pratos principais: pedi um camarão com molho de especiarias e coco. Serve pouco, mas eu já tinha comido tanto antes que fiquei cheio logo no começo. Foi uma ótima escolha, porque tudo é muito picante, e o coco deixa a refeição quase doce, curando a boca. Ah, acompanhei tudo com um muito necessário lassi, o iogurte indiano. Ainda pedimos um frango grelhado com molho de iogurte, que é bom, mas fica melhor sem o iogurte, e um frango com curry e castanhas, bem razoável. Acho que o melhor prato foi o meu mesmo.


Para a sobremesa não há tantas opções, mas você não precisa realmente escolher quando se tem kulfi à disposição. Kulfi é o tal sorvete indiano misturado com especiarias, uma delícia sem fim. Foi só a segunda vez que provei (a primeira foi em Joanesburgo, num restaurante árabe-indiano, ou de indianos islâmicos, ou de comida indiana halal, enfim) e acho que estava ainda melhor que na estreia.

Pra finalizar, se você ainda tiver espaço na barriga, um chá. O garçom vai te trazer a caixinha da Delta para você escolher entre os sachês com as opções de sempre. Rejeite e peça chá indiano de verdade, e eles vão te servir um chá preto com leite realmente típico, e que provavelmente fica lá guardado, reservado para os donos. É uma excelente despedida.